No começo a Medicina Veterinária e a Zootecnia eram ambientes quase restritos aos homens.  As mulheres foram chegando suavemente, porém com decisão, e hoje são  58.437 médicas veterinárias atuantes,  49% do total  dos  118.339   profissionais em atividade no Brasil.

Já as zootecnistas em atividade somam 2.713 profissionais, cerca de 30% do total de profissionais (8.912) que trabalham  na área no Brasil. Os dados do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV)   são do final de fevereiro de 2018.

Na Bahia,   são  1.906 médicas veterinárias (total de 5.490 inscritos)  e    97 zootecnistas   (total de 433 inscritos) em atuação, segundo dados do  Sistema de Cadastro (Siscad).

Neste 08 de março, dia internacional da mulher, homenageando todas as profissionais ativas ou aposentadas,  trazemos uma matéria especial com três mulheres.  São três perfis.  Três pessoas totalmente distintas entre si, cujo ponto em comum é o amor pela profissão escolhida.

Uma é baiana de Salvador, empresária, médica veterinária,  esposa e mãe de médicos veterinários. Outra,  é de Itabuna, sul da Bahia,  que  construiu carreira acadêmica com doutoramento em Zootecnia e trabalha na indústria. A terceira, uma gaúcha antes radicada em São Paulo e agora trabalhando como jornalista e médica veterinária na Bahia.

Cada uma delas tem uma trajetória bem-sucedida  que mostra a determinação e coragem das mulheres.

Sílvia Corrêa, jornalista e médica veterinária

Gaúcha de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, foi criada em São Paulo desde os oito anos de idade. Após uma carreira vitoriosa no jornalismo, ela decidiu cursar Medicina Veterinária.

MV Sílvia Corrêa nos Estados Unidos onde cursou especialização
Foto: Álbum Pessoal

Movida pela curiosidade, queria aprender sobre arquitetura, medicina… tudo lhe chamava a atenção.  Muito cedo definiu que jornalismo seria um campo adequado para exercer a curiosidade que o mundo lhe trazia, pois como ela mesma define “jornalismo transita por diversas áreas”.

Começou adolescente, aos 16 anos,  e passou pelas maiores redações de jornal impresso e telejornalismo do país. A primeira experiência foi no Grupo Folha, tendo começado no jornal “Notícias Populares” (circulou entre 15 de outubro de 1963 a  20 de janeiro de 2001), o conhecido NP, cujo nicho eram as notícias de segurança pública reportadas em tons crus.  Depois, ainda no Grupo Folha, trabalhou na Folha da Tarde, tendo chegado ao disputado cargo de editora da Primeira Página.  Por fim, foi convidada para a “joia da coroa” do grupo da família Frias: A Folha de São Paulo, impresso de maior circulação do Brasil. Lá, foi repórter de política, de cotidiano, e é colunista até hoje.

Após 15 anos de impresso, metade da vida, Sílvia Corrêa se transferiu para o telejornalismo como repórter do Jornal da TV Record apresentado na época por Bóris Casoy.  Depois vieram outras TVs como a Globo, a Gazeta, o SBT e hoje a Rádio Band  e  a TV Band Bahia.

Foi o colega Bóris Casoy quem inspirou a entrada da Medicina Veterinária na vida dela: ele dizia que gostaria de ter sido  médico veterinário além de jornalista.  Ela foi cursar uma segunda graduação (já era formada em Comunicação pela USP) em um curso de cinco anos em uma faculdade privada.  Vieram o mestrado e  a residência na USP, os cursos em Ohio e  na Carolina do Norte (estados norte-americanos) e no Canadá.

Em 2016, já professora em uma faculdade,  veio para a Bahia dirigir um hospital veterinário universitário e clinicar como neurologista, mas em determinado momento o jornalismo a puxou de volta.

Para ela, não há oposição entre o Jornalismo e a Medicina Veterinária e afirma “o bom médico veterinário  e o bom jornalista são movidos pelo interesse em fazer boas perguntas”,  e ainda explica “fazer boas perguntas é mostrar interesse pelo paciente para chegar ao melhor diagnóstico”.  E depois conclui “não é toda profissão que precisa desta curiosidade”.

A médica veterinária e jornalista relata que gosta igualmente de cuidar de  seus pacientes neurológicos,  e de apresentar seu novo programa de entrevistas, cuja  primeira edição que estreou no final de fevereiro, recebeu o governador do estado.

Na redação da TV Band Bahia as  jornalistas Carolina Rosa (apresentadora do Band Cidade), 
Sílvia Corrêa,(médica veterinária e apresentadora do Band Entrevista), Zuleika Andrade
(diretora de Jornalismo da Band Bahia) e Juliana Guimarães (apresentadora do programa 
Donos da Bola) Foto: Àlbum Pessoal

Esposa, tutora de uma cadelinha, jornalista, médica veterinária e professora, Sílvia Corrêa é uma mulher que traduz em sua trajetória os vários papéis exercidos pelas mulheres principalmente  partir do século passado. E faz isto muito bem.

Luzyanne  Varjão Aguiar, Zootecnista

A doutora na indústria

Foto: Álbum pessoal

 

De um lado os avôs paternos  eram agricultores e pecuaristas no extremo Sul da Bahia. De outro lado os avôs maternos eram cacauicultores no sul da Bahia. E desde bem pequena a menina preferia passar suas férias escolares brincando na roça e aprendendo os segredos do campo enquanto os primos escolhiam veranear no litoral.

A vivência no meio rural permitiu que a zootecnista, doutora em Nutrição Animal, Luzyanne Varjão Aguiar, criasse intimidade com o campo e com  os animais  e isso contribuiu muito cedo para a sua decisão com o que desejava trabalhar.

Na hora de prestar vestibular em 2001  não teve dúvidas: se inscreveu para Zootecnia na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) e foi aprovada, sendo posteriormente também aprovada em outras instituições,  mas já havia se encantado com o campus de Itapetinga e optou em continuar com a primeira escolha.

Logo no comecinho da graduação, a  mãe,   a pedagoga Luciana Varjão Santana Aguiar ( “in memorian”),   teve dúvidas,  pois preferia que ela optasse por outro curso  na área de ciências biológicas e saúde, mas o pai, o Agrimensor José Eduardo Santana de Aguiar,  apoiou a filha permitindo que ela saísse de Itabuna e  fosse  morar em Itapetinga para  se graduar  no curso escolhido.

Na graduação, se voltou para a pesquisa sendo bolsista da  Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FABESB)  e  da   Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).  O sucesso acadêmico foi inquestionável,  tendo concluído o Bacharelado em Zootecnia (2007) e no mesmo ano foi aprovada no mestrado em Produção de Ruminantes para cursar no ano seguinte. O tema defendido na dissertação do mestrado foi “Silagens do co-produto da extração do palmito de pupunha na alimentação de ovinos” .

23 de fevereiro

Ao tempo que concluía o mestrado já estava aprovada para cursar o Doutorado no qual pesquisou ” Aditivo Palatabilizante e aglomerante elaborado com vagem de algaroba para alimentação animal“.  Por coisas da vida, a defesa do mestrado e a do doutorado ocorreram no mesmo dia: 23 de fevereiro, com quatro anos de diferença:  uma em 2010 e a outra em 2014.

Ao lembrar-se do doutorado recente ela fala que nunca pensou que “não daria conta” de alguma coisa na vida, porque  não se entrega às dificuldades. Diz sempre que  “ Deus é a minha  fonte de inspiração” e repete o  versículo bíblico:  ” Tudo é possível ao que crê”.  Relata como foi abrangente sua tese de doutorado, que  envolvia cinco experimentos de campo e que  cada um deles poderia render uma dissertação.  O projeto audacioso demandou  muito trabalho de campo, análises laboratoriais, tabulação de dados, redação do texto e registro de produto.  Considera que cumpriu “um enorme desafio”.

Tendo sido a primeira da família a chegar tão longe academicamente,  vê com felicidade familiares investindo   tempo  nos estudos e buscando melhorias para a vida profissional.

Hoje trabalha na indústria de rações em uma rotina frenética  explicando que a  “produção não para e temos  de estar de prontidão inclusive aos finais de semana”.

Mesmo na correria entre as atividade diárias a zootecnista procura reservar momentos com o marido Áttila e filha Maria Eduarda

Mãe orgulhosa de Maria Eduarda, de três anos, relata empolgada que a menina já sabe distinguir algumas raças caninas ao ver um animal.  Tentando  harmonizar os interesses acadêmicos participando de bancas com  o trabalho na indústria, com a criação de buldogue francês e de cavalos, com  as demandas de esposa e com os cuidados com Maria Eduarda,  a doutora Luzyanne não poupa esforços para conciliar todas estas exigências, reconhecendo que “filho coloca limites e às vezes é necessário abrir mão de algumas coisas”.

Pouco vaidosa, no dia a dia se contenta em vestir camisa gola polo, calças jeans e a tão amada botina, priorizando a praticidade na vida diária. Como gerente de fábrica  lidera a equipe de produção, cuida da  compra de insumos, da venda dos produtos, da formulação  de rações e suplementos minerais. Após elencar todas estas atribuições, ela  diz de modo pensativo  que  “mulher sempre dá conta, pois consegue fazer muitas coisas ao mesmo tempo e de salto alto, ainda que seja o da bota”.

Ao concluir a conversa, sem citar dogmas religiosos afirma “sempre tenho o pensamento que tenho o apoio de Deus!”

Kátia Requião, médica veterinária

Divide a liderança da “família  da Medicina Veterinária” com o esposo, também médico veterinário

Desenvolta e em tom de voz caloroso, a médica veterinária Kátia Requião vai conversando animadamente, respondendo perguntas e trançando memórias de sua trajetória pessoal e profissional.

Como a MV Sílvia Corrêa do primeiro dos três perfis,  na época de vestibular ela teve dúvidas.  Pensou em Medicina Veterinária, mas escolheu fisioterapia.

Rindo, ela conta que “o universo conspira”, pois conheceu um  determinado estudante de Medicina Veterinária, se casou com ele  e é o seu marido há três décadas, Dr. Luciano.   O jovem casal empreendedor montou uma clínica que tinha salão e pet shop e a fisioterapeuta-futura-médica-veterinária  começou a trabalhar com animais no setor de tosa enquanto o marido fazia atendimentos clínicos.

Após um ano, decidiu que retornar à Universidade Federal da Bahia, mas agora cursando Medicina Veterinária.  Decisão tomada, se inscreveu  foi aprovada no concorrido vestibular.

Estava no segundo semestre quando engravidou da primeira filha, Larissa. Pouco tempo depois ganhou o segundo bebê, um menino  que recebeu  o mesmo nome do pai, Luciano, e na sequência teve a caçula, Juliana.  Com uma recém-nascida, um menininho de um ano e uma garotinha de dois, a estudante teve de deixar a Escola de Medicina Veterinária para cuidar da família.  Os colegas da época ainda hoje brincam com ela afirmando “só lembro de você grávida e correndo”.  E ela realmente corria, pois queria estudar e amamentar cada filhinho no mínimo até os seis meses.

Ao tempo que os bebês ficaram mais crescidos  ela pode voltar a estudar  para concluir o curso.   Hoje, os três filhos  são médicos veterinários e a mãe se diverte  dizendo que é porque  eles “assistiram aulas ainda na barriga”.

Atualmente a atenção da Dra. Kátia está voltada para o trabalho com imagens:  Raio X, Ultrassom  etc.   Explica que ama o que faz, tanto que  passou o último final de semana imersa em laudos   para entregar resultados a tempo para os tutores.

Gosta tanto  do trabalho e  dos animais que se envolve emocionalmente com os resultados dos pacientes veterinários.  Ao ver uma imagem que mostra um caso terminal ela diz que sempre fica muito sensibilizada  com o quadro crítico. 

Com décadas de experiência, a médica veterinária analisa que o perfil dos tutores vem mudando bastante: “antes os animais ficavam no quintal, hoje são da família”. Ela mesma é uma destas tutoras.  Doze anos atrás recolheu a cadelinha Meg,  mestiça que  mora na sala dela e não arreda pé “do trabalho” enquanto a doutora está fazendo exames em algum paciente. Meg é uma paciente oncológica que está indo para a quarta cirurgia A tutora-médica-veterinária se emociona ao relatar a situação do animal, mas deixa claro que enquanto tiver possibilidade vai insistir que tenha toda atenção médica e qualidade de vida.  E  Meg não é a única. Ano passado faleceu outra “recolhida”, a cadelinha  Filomena, que era paraplégica e ficou  anos com  a família Requião.  Além de Meg,  a  médica veterinária divide carinho com um gato preto mestiço, Zeca e uma Yorkshire de nome Taty.

Meg

 

 

 

 

 

 

 

 

Zeca

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Taty

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os cinco membros da família  trabalham nas duas clínicas fundadas pelo casal , cada um cuidando da parte que sabe fazer melhor.  Aqui, diz ela, “todos correm juntos”.  Ver a família trabalhando unida em algo que todos gostam faz a doutora Kátia  afirmar que “não mudaria nada na minha vida, faria tudo de novo”.

Uma "família da Medicina Veterinária". Da esquerda para a direita: MV Juliana Requião, 
MV Larissa Requião, MV Luciano Requião, MV Kátia Requião e MV Luciano Requião.

 

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